terça-feira, 6 de agosto de 2013

O MONÓLOGO DO CASO TELEFÔNICO


Depois de dizer por varias vezes a ele, eu odeio telefone, ele simplesmente me diz: Liga pra mim!
            E eu tenho vários motivos para odiá-lo, tem aquelas pessoas metidas à telefonista que falam o tempo todo Ok. Ok. Ok. e a gente fica esperando minutos sem fim até a pessoa resolver encerrar a conversa. Existem aquelas que perguntam: De onde falam? E a gente responde com a maior paciência “É da casa de fulano de tal”, o número é etc. etc. E tal, aí a outra diz “É engano” e Tu. Tu. Tu. E o som reflete o descaso de quem nem se importou de pedir desculpas.
            Mas voltando ao assunto, eu odeio mesmo telefone e ele me diz: Liga pra mim! Aí eu ligo, é claro de um telefone público – daqueles que mais parecem uma orelha enorme e que engole todos os nossos créditos a cada trinta segundos.
            Bom, de início o telefone mais próximo de minha casa fica perto de uma padaria que mais se parece com um boteco; vende lingüiça no palito, ovo cozido colorido e cachaça. Imagine você que além de encarar aquela orelha azul e enorme me engolindo ainda tenho que presenciar cenas bizarras de escolhas alegres entre o ovo e a lingüiça assada.
            Então procuro esquecer o meu mau humor e lá vou eu discando o número da minha futura sogrinha (tenho que tratá-la bem) e todo mundo olhando, quando o danado do orelhudo engole, descaradamente todos os créditos do meu único cartão telefônico, meu único cartão, é claro, que afanei da gaveta de minha irmã que adora por sinal esse telefone. Então decido ir ao caixa comprar mais um cartão.
            _ Só um? Pergunta o rapaz com uniforme laranja escrito Padaria Bom Preço.
            _ Eu falo pouco ao telefone – respondo
            Sei por experiência própria que a futura sogrinha atenderá e eu perguntarei: Tudo bem? E ela como sempre me dirá: Mais ou menos e fingindo atenção e comovida pedirei: Pode chamar o amorzinho!
            Completo a chamada e o telefone toca, toca, toca.
            Escuto sua voz fraca, e pergunto: Tudo bem? Hei sogrinha, sou eu sua norinha preferida, e Tu. Tu. Tu.
            Você já imaginou alguém que decididamente odeia telefone, levar um bem na cara. Será que a sogrinha endoidou, pirou?
            _ Moço, mais um cartão!
            _ Só um?
            _ Eu falo pouco ao telefone.
            E o telefone toca, toca e toca.
            _ Alô!
            _ Alô... De onde fala?
            _ Alô... Quem fala?
            _ Cunhadinha sou eu, sua...
            _ Ô engraçadinho, vê se para de encher o meu saco!
            _ Mas, cunhadinha o que eu fiz?
            _ Vagabundo!
            E tu... Tu... Tu.
            Pô tá certo que eles são de raça quente “italianos”, mas, já estão exagerando.
            _ Moço, mais um cartão.
            _ Só um?
            _ Eu falo pouco.
            E o telefone toca, toca e toca.
            _ Alô!
            _ Amorzinho... Sou eu.
            _ Molambento velho! Ahahahaha
            _ Ô amorzinho... O que está acontecendo?
            _ Baranga!
            E tu... Tu... Tu...
            Dessa vez não deu para agüentar, o “idiota” me chamou de “baranga”.
            _ Ô moço, mais um cartão.
            _ Só um?
            _ Já disse que eu falo pouco.
            E o telefone toca, toca, toca.
            _ Alô!
            _ Ô sogra, chama ai o “corno” do seu filho! (nisso o boteco parou de beber)
            _ Vai pra P... Q... P
            _ Não vou não.
            _ Filha de uma p...
            E tu... Tu... Tu...
            Família busca-pé!  E eu que disse a ele que odiava telefone. E o fulaninho sem vergonha (que até pouco tempo era meu amorzinho) nem coragem de me enfrentar teve. Decididamente estava tudo acabado, mas como eu sou muito sentimental, não poderia deixar de chorar copiosamente, desesperadamente dentro do boteco, digo padaria.
            _ ô moca!
            _ Eu não quero mais cartão.
            _ Mas, o telefone está quebrado.
            _ O que?
            _ Quebrado.
            _ Não funciona?
            _ É... Quebrado é quebrado, né?
            _ Mas como?
            _ Bem... É o seguinte, o camarada fala, fala, fala e do outro lado... Bulhufas, ninguém escuta nada.
            _ O que?
            _ Tenho que vender os cartões.
            _ Sacanagem heim?
            Já ia saindo quando me lembrei.
            _ Ô sacana, tem certeza que ninguém ouviu o que eu disse?
            _ Tá quebrado né moça!
            _ Ufa... Que sorte!
            _ Sorte?
            _ Ah... Deixa pra lá!
            E pensei, porque pensar é melhor que telefonar, pelo menos não teria nada o que explicar.

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